Todos nós nos sentimos muito bem quando estamos em contato com a natureza. Estar em meio ao verde, poder contemplar o nascer ou o pôr-do-sol ou deitar sob a luz da lua e das estrelas costuma ser capaz de recarregar todas as nossas energias. Para o campista muitas vezes essa é a principal razão para juntar as tralhas, colocar a mochila ou a casa nas costas e partir para seu destino de acampamento.
Um estudo da Universidade de Berkeley, na Califórnia traz evidências que mostram que a ciência também concorda que a natureza pode trazer grandes benefícios para a saúde física e mental. Confira a íntegra do texto logo abaixo:
Cada vez mais gastamos mais tempo dentro de casa e online. Mas estudos recentes sugerem que a natureza pode ajudar os nossos cérebros e corpos a se manterem saudáveis.
Os cientistas estão começando a encontrar evidências de que estar na natureza tem um impacto profundo sobre o nosso cérebro e nosso comportamento, nos ajudando a reduzir a ansiedade, a inquietude e o estresse. Isso também umenta a nossa capacidade de atenção, criatividade, e nossa habilidade de se conectar com outras pessoas.
“As pessoas têm discutido suas experiências profundas na natureza durante os últimos 100 anos – de Thoreau a John Muir, além de muitos outros escritores”, diz o pesquisador David Strayer, da Universidade de Utah. “Agora estamos vendo mudanças no cérebro e mudanças no corpo que sugerem que somos fisicamente e mentalmente mais saudáveis quando estamos interagindo com a natureza.”
Enquanto ele e outros cientistas acreditam que a natureza beneficia o nosso bem-estar, nós vivemos em uma sociedade onde as pessoas passam cada vez mais tempo dentro de casa e on-line, especialmente as crianças. As conclusões sobre como a natureza melhora o nosso cérebro acrescentou legitimidade ao chamado de preservação da natureza – tanto urbana quanto selvagem – e para a necessidade de passar mais tempo na natureza, a fim de levar uma vida mais saudável, mais feliz e criativa.
Aqui estão algumas das maneiras que a ciência mostra como estar na natureza afeta nossos cérebros e corpos.
- Estar na natureza diminui o estresse
É claro que caminhadas ou qualquer atividade física pode reduzir o estresse e ansiedade. Mas há algo sobre estar na natureza que pode aumentar esses impactos.
Em um experimento recente realizado no Japão, os participantes foram designados a caminharem na floresta ou em um centro urbano (em caminhadas com as mesmas distâncias e grau de dificuldade) enquanto eram medidas as alterações de suas frequências cardíacas, ritmo cardíaco e pressão arterial. Os participantes também preencheram questionários sobre o seu humor, os níveis de estresse e outras medidas psicológicas.
Os resultados mostraram que aqueles que caminharam em florestas tinham frequências cardíacas significativamente mais baixas e melhor ritmo (indicando maior relaxamento e menos estresse), e relataram melhor humor e menos ansiedade do que aqueles que caminharam em ambientes urbanos. Os pesquisadores concluíram que há algo sobre estar na natureza que teve um efeito benéfico na redução do estresse, além do que o exercício por si só poderia ter produzido.
Em outro estudo, pesquisadores da Finlândia descobriram que moradores urbanos que caminhavam por pelo menos 20 minutos através de um parque urbano ou floresta relataram significativamente mais alívio do estresse do que aqueles que caminhavam pelo centro da cidade.
As razões para este efeito não são claras, mas os cientistas acreditam que evoluímos de maneira a sermos mais relaxados em espaços naturais. Em um clássico experimento de laboratório feito por Roger Ulrich, da Texas A & M University e seus colegas, os participantes que primeiro viram um filme de indução de stress, e foram então expostos a vídeos com cores/sons com cenas naturais, mostraram uma recuperação muito mais rápida e mais completa do estresse do que aqueles que tinham sido expostos a vídeos de ambientes urbanos.
Estes estudos e outros fornecem evidências de que estar em espaços naturais – ou mesmo apenas olhando para um ambiente natural através de uma janela de alguma forma nos acalma e alivia o estresse.
- A natureza te deixa mais feliz e menos inquieta(o)
Eu sempre achei que caminhadas na natureza fazia me sentir mais feliz, e, claro, diminuir o estresse pode ser em grande parte a razão de isso acontecer. Mas Gergory Bratman, da Universidade de Stanford, encontrou evidências de que a natureza pode afetar o nosso humor de outras maneiras também.
Em um estudo de 2015, ele e seus colegas escolheram aleatoriamente 60 participantes para fazerem 50 minutos de caminhada em um cenário natural (bosques de carvalho) ou em um ambiente urbano (ao longo de uma estrada de quatro pistas). Antes e depois da caminhada, o estado emocional e as medidas cognitivas dos participantes foram avaliadas, tais como quão bem eles podiam executar tarefas que exigiam memória de curto prazo. Os resultados mostraram que aqueles que caminharam na natureza sentiram menos ansiedade, ruminação (a atenção para aspectos negativos de si mesmo), e sentimentos negativos, assim como emoções mais positivas, em comparação com os caminhantes urbanos. Eles também tiveram melhor desempenho nos testes de memória.
Em outro estudo, ele e seus colegas estenderam esses resultados concentrando-se em como caminhar na natureza afeta o que eles chamaram de ruminação – que tem sido associado com o início de estados de depressão e ansiedade – enquanto usam ao mesmo tempo a tecnologia de fMRI, que observa a atividade cerebral. Os participantes que foram submetidos a 90 minutos de caminhada em um cenário natural ou em um cenário urbano tiveram seus cérebros escaneados antes e depois de suas caminhadas e foram inquiridos sobre os níveis de ruminação auto-reportados (assim como outros marcadores psicológicos). Os pesquisadores fizeram um controle sobre os muitos fatores potenciais que podem influenciar a ruminação ou a atividade cerebral – por exemplo, níveis de atividade física foram medidos pelas taxas cardíacas e funcionamento pulmonar.
Mesmo assim, os participantes que caminharam em um ambiente natural versus um ambiente urbano relataram diminuição da ruminação após a caminhada, e eles mostraram aumento da atividade no córtex pré-frontal, uma área do cérebro cuja falta de atividade é associada com depressão e ansiedade – uma descoberta que sugere que a natureza pode ter impactos importantes sobre o humor.
Bratman acredita que resultados como estes precisam alcançar urbanistas e outros profissionais cujas ações exerçam impactos nos nossos espaços naturais. “Os serviços que afetam os ecossistemas estão diretamente ligados às decisões em todos os níveis de ordem pública, uso e planejamento do solo e desenho urbano, e é muito importante garantir os resultados empíricos da psicologia sejam incorporados nessas decisões”, diz ele.
- Natureza alivia o cansaço e aumenta a criatividade.
Hoje, a tecnologia é onipresente em nossas vidas e ela é concebida exatamente para atrair constantemente nossa atenção. Mas muitos cientistas acreditam que nossos cérebros não foram feitos para este tipo de bombardeio de informações, o que pode levar à fadiga mental, opressão e esgotamente, exigindo uma “restauração de atenção” para voltar a um estado normal saudável.
Strayer é um desses pesquisadores. Ele acredita que estar na natureza restaura circuitos de atenção debilitados, que podem nos ajudar a ser mais abertos à criatividade e resolução de problemas. “Quando você usa seu telefone celular para falar, escrever textos, tirar fotos, ou qualquer outra coisa que você possa fazer com seu telefone celular, você está tocando no córtex pré-frontal e causando reduções nos recursos cognitivos”, diz ele.
Em um estudo de 2012, ele e seus colegas mostraram que as pessoas que partiam em suas caminhadas em uma viagem de mochila de quatro dias, poderiam resolver significativamente mais quebra-cabeças que exigem criatividade quando comparados a um grupo de pessoas que estava esperando para fazer a mesma caminhada . Na verdade 47% mais. Embora outros fatores podem ser responsáveis por seus resultados, por exemplo o exercício ou a amizade estando fora todos juntos, estudos anteriores sugeriram que a própria natureza pode desempenhar um papel importante. Um estudo na Psychological Science descobriu que o impacto da natureza sobre a restauração da capacidade de atenção é o responsável por melhorar os resultados nos testes cognitivos para os participantes do estudo.
Este fenômeno pode ser devido a diferenças na ativação do cérebro durante a visualização de cenas naturais contra cenas mais urbanizadas, mesmo para aqueles que normalmente vivem em um ambiente urbano. Em um estudo recente realizado por Peter Aspinall na Universidade Heriot-Watt, de Edimburgo, e seus colegas, os participantes que tinham seus cérebros monitorados continuamente usando eletroencefalograma móvel (EEG), enquanto eles caminhavam através de um espaço verde urbano, tinham leituras de EEG indicando menor frustração, combatividade e excitação, além de níveis superiores de meditação enquanto em áreas verdes, assim como níveis de combatividade mais elevados quando se deslocavam para fora da área verde. Esta diminuição da combatividade e da excitação pode ser o que permite a restauração da capacidade de atenção, encorajando uma maior abertura, uma mente mais meditativa.
É este tipo de atividade cerebral – às vezes atribuída como “a rede padrão do cérebro” – que está ligada ao pensamento criativo, diz Strayer. Ele está atualmente repetindo seu estudo anterior de 2012 com um novo grupo de caminhantes e gravando suas atividades EEG e os níveis de cortisol presente na saliva antes, durante e depois de uma caminhada de três dias. Em breve as análises das leituras de EEG poderão apoiar a teoria de que caminhadas na natureza podem restaurar as redes de atenção das pessoas e ajuda-las a restaurar suas redes padrão.
Strayer e seus colegas também estão olhando especificamente os efeitos da tecnologia, monitorando leituras de EEG das pessoas enquanto elas andam em um viveiro de plantas, tanto ao falar em seu telefone celular ou não. Até agora, eles descobriram que os participantes com telefones celulares parecem ter leituras de EEG consistentes com uma sobrecarga de atenção e podendo recordar apenas metade dos muitos detalhes de um arboreto pelo qual eles simplesmente atravessaram, em comparação com aqueles que não estavam em um telefone celular.
Embora as descobertas de Strayer sejam preliminares, elas são consistentes com os resultados de outras pessoas sobre a importância da natureza para a restauração da atenção e criatividade.
“Se você está usando seu cérebro para multitarefa como a maioria de nós fazemos a maior parte do dia e em seguida você deixar isso de lado e sair para uma caminhada, sem todos aquelas aplicações, você permite que o córtex pré-frontal se recupere” diz Strayer. “E é exatamente quando temos explosões de criatividade, resolução de problemas e sentimentos de bem-estar.”
- A natureza pode ajudá-lo a ser gentil e generoso
Sempre que eu vou para lugares como Yosemite ou a Big Sur Coast da California, eu tenho a sensação de voltar para a minha vida apta a ser mais gentil e generosa com os que me rodeiam. É só pedir perguntar ao meu marido e às crianças! Agora alguns novos estudos podem lançar luz sobre por que isso acontece.
Em uma série de experimentos publicados em 2014, Juyoung Lee, Dacher Keltner diretor da GGSC, e outros pesquisadores da Universidade de Berkeley – da Califórnia, estudaram o impacto potencial da natureza na vontade de sermos generosos, confiantes e úteis para com os outros, considerando quais os fatores que podem influenciar essa relação.
Como parte de seu estudo, os pesquisadores expuseram os participantes a algumas belas cenas da natureza (cujos níveis de beleza foram classificados independentemente), uns mais outros menos imagens. Depois observou como os participantes se comportaram jogando dois jogos – os jogos Dictator Game e Trust Game – que medem generosidade e confiança. Após serem expostos a cenas bonitas de natureza, os participantes ao jogar, eram mais generosos e mais confiantes do que aqueles que viram menos cenas naturais. Os efeitos parecem ser devido aos aumentos correspondentes na emoção positiva.
Em outra parte do estudo os pesquisadores pediram para pessoas preencherem um questionário sobre as suas emoções enquanto está sentado em uma mesa onde mais ou menos plantas foram colocadas. Depois, os participantes foram informados de que o experimento acabou e eles poderiam sair, mas que se quisessem eles poderiam se oferecer para fazer origamis (os tsurus – aqueles pássaros de papel tradicionais) para um programa de ajuda ao Japão. O número de origamis que eles fizeram (ou o que não fizeram) foi usado como uma medida da sua “pró-sociabilidade” ou vontade de ajudar.
Os resultados mostraram que a presença de plantas mais naturais aumentou significativamente o número de origamis feitos pelos participantes e que este aumento foi novamente mediado pela emoção positiva provocada pela beleza natural. Os pesquisadores concluíram que experimentar a beleza da natureza aumenta positivamente a emoção, talvez por ser fonte de inspiração, um sentimento de saber que se é parte de algo maior que si mesmo, o que leva a comportamentos pró-sociais.
O suporte para esta teoria vem de um experimento conduzido por Paul Piff, da Universidade da Califórnia, Irvine, e colegas, em que os participantes olhando para um bosque de árvores muito altas por apenas um minuto experimentaram aumentos mensuráveis de respeito, demonstrando um comportamento mais prestativo e uma abordagem mais ética de dilemas morais, do que os participantes que passaram a mesma quantidade de tempo olhando para um edifício alto.
- Natureza faz você “se sentir mais vivo”
Com tudo o que a natureza proporciona, não é nenhuma surpresa que a ela nos faça sentir mais vivos e vitais. Estar ao ar livre nos dá energia, nos faz mais felizes, nos ajuda a aliviar as tensões do cotidiano de nossas vidas cheias de compromissos e abre portas para a criatividade e ajuda-nos a ser gentil com os outros.
Ninguém sabe se existe uma quantidade ideal de exposição natureza, embora Strayer diga que mochileiros de longa data sugerem um mínimo de três dias para realmente desconectar do nosso cotidiano. Ninguém pode dizer com certeza como a natureza se compara a outras formas de alívio do estresse ou na restauração da capacidade de atenção como o sono ou meditação, por exemplo. Strayer e Bratman dizem que precisamos de muitas outras pesquisas cuidadosas para trazer à tona esses efeitos antes de chegarmos a conclusões definitivas.
Ainda assim, a pesquisa sugere que há algo sobre a natureza que nos mantém psicologicamente saudável e isso é bom saber… especialmente porque a natureza é um recurso gratuito e que muitos de nós podemos acessar por apenas uma caminhada para além da nossa própria porta. Resultados como esses devem encorajar-nos como uma sociedade a considerar com mais cuidado sobre como preservar nossos espaços selvagens e nossos parques urbanos.
E mesmo a pesquisa ainda não sendo conclusiva, Strayer está otimista de que a ciência acabará por entender o porquê de pessoas que, como eu, também intuem que há algo na natureza que nos renova, permitindo-nos sentir melhor, pensar melhor, e para aprofundar nossa compreensão de nós mesmos e dos outros.
“Você não pode ter centenas de pessoas escrevendo sobre isso e não perceber que tem alguma coisa acontecendo”, diz Strayer. “Se você está constantemente em um dispositivo móvel ou na frente de uma tela, você está perdendo algo que é muito espetacular: o mundo real.”
Artigo de Jill Suttie, publicado originalmente no site Greater Good, da Universidade de Berkeley, California:
http://greatergood.berkeley.edu/article/item/how_nature_makes_you_kinder_happier_more_creative